Crepúsculo: Literatura de massa em sala de aula
Professora Raquel Santos Zandonadi
Professora Raquel Santos Zandonadi
Sou professora de língua portuguesa daqui do Bernardino há mais de três anos e acredito ser o principal objetivo da minha disciplina a valorização da leitura, pois é com ela que os alunos ampliarão sua visão de mundo e se expressarão de maneira mais clara. Por isso sempre faço aula de leitura com os alunos, e como na escola não há exemplares suficientes para que eu trabalhe o mesmo título na sala, tenho um armário na “experimentoteca” com vários livros da biblioteca e deixo que cada aluno escolha o que quer ler. Em certo momento da aula, e nessa sala os alunos ficam lendo silenciosamente (lindos!), eu interrompo perguntando sobre a leitura, deixando quem quiser contar um pouco a respeito de seu livro.
Bom, em uma dessas aulas eu resolvi falar sobre o livro que eu estava lendo, coisa que faço sempre: enquanto eles leem eu também leio. Nesse momento estava lendo Crepúsculo, de Stephenie Meyer, obra que faz parte da saga que se tornou uma verdadeira febre entre adolescentes.
Estava lendo esse livro porque desde que comecei a trabalhar no ensino médio, minhas alunas viviam me falando de um livro sobre vampiros, para o qual eu recusava a dar credibilidade por vê-lo como “não artístico” demais. Este ano, porém, uma de minhas alunas apareceu com o livro nas mãos e me intimou a lê-lo. Tudo bem vai, pensei, como professora de literatura preciso saber o que meus alunos andam lendo. Comecei então sem nenhum entusiasmo, acreditando que faria uma espécie de leitura dinâmica para acabar mais rápido com a lição de casa. Depois dos primeiros capítulos vi que, de fato, não se tratava de uma obra artística, mas, para minha surpresa, a história me ... digamos... seduziu bastante, a ponto de me fazer ler mais de 170 páginas mesmo depois de dez horas de trabalho. Tem gente que sabe ganhar dinheiro, e admito que essa escritora sabe.
Enfim, nessa aula da 6ª série B, comecei a contar do que se tratava esse livro e alguns alunos disseram que haviam assistido ao filme e muitos se interessaram. Aproveitei esse interesse e li, na aula seguinte, o primeiro capítulo da obra para os alunos. Eles adoraram, e eu disse que se o livro fosse meu, eu o leria para eles na aula de leitura, mas precisava devolvê-lo a dona. Para minha surpresa, os alunos organizaram uma vaquinha e me pediram para comprar o livro para a turma. Agora, depois de quatro meses, estamos quase terminado. Sei que muitos alunos têm dificuldade de se concentrar na história, já que leio quase uma hora e meia por semana, na nossa aula dupla de quarta-feira. No entanto, a grande maioria gosta bastante e sei que muitos começaram a se interessar mais pelos livros.
Mesmo sendo uma pessoa que valoriza bastante os clássicos, mudei de ideia a respeito da literatura de massa depois dessa experiência e acredito que esses livros devam sim ser trabalhados em sala de aula. Já que são muito vinculados pela mídia, estão na boca do povo, e precisamos aproveitar qualquer chance de valorização da leitura. Além disso, vejo que nossos alunos chegam ao ensino médio sem bagagem literária, pois não se interessam pelos livros trabalhados na escola. Aí fica difícil fazer com que leiam os clássicos. Acredito que se tiverem lido, no ensino fundamental, pelo menos alguns desses livros considerados de massa, possam de fato ler e reconhecer o valor literário de um Machado de Assis ou, quem sabe, de um Guimarães Rosa.